quarta-feira, 28 de novembro de 2007

First approach

Desculpem-me a gíria e terminologias aqui necessárias, mas só assim se contextualiza.
A partir daqui só magia……

“..Quando os marinheiros portugueses primeiro se aventuraram nos mares ao largo da costa africana depararam-se com grandes aves brancas e negras, de asas pontiagudas.
Chamaram-lhes alcatrazes, que os marinheiros ingleses corromperam para albatrozes..”



Mais uma manhã fria, creio ao que me lembro de primavera.
Mais um ritual habitual que sempre executávamos mecanicamente em silencio.
São cerca das 6.00 da manhã e o Caranks entra mais uma vez na água.

Os três carregamos os equipamentos quase sequencialmente, o silencio é absoluto, só o mar bate, hoje pouco.


As gaivotas ainda dormem, à nossa volta centenas.
A saída do Porto da Barca (Zambujeira do Mar) é sempre complicada sem a maré cheia, rochas quase à superfície, roçam por vezes o casco, nunca aconteceu.
Rumamos a Sul, nem sei se já dissemos algo uns aos outros, tínhamos saído da toca cedo demais, mas era a maré.


O Yamaha de 30CV começa no seu ronco a fundo, cada vaga que saltamos é o mar em vida.
Chegamos à primeira zona onde vamos cair (mergulhar), paramos.
Os locais são-nos tão familiares que a precisão com que paramos neles é absoluta.

A calema embala, é uma daquelas sensações indescritíveis.

Preparávamo-nos para deitar o ferro, quando uma ave enorme poisa na proa da embarcação, enorme.
Logo de primeira vimos ser um grande Albatroz, mas como parou tão precisamente na proa ?

Não o querendo assustar não conseguimos largar o ferro da embarcação, tinha as enormes patas no cabo, ainda enrolado.
Fitou-nos um a um, tinha uns olhos grandes, lindos de mil cores.

A luz da alvorada raiava por cima da falésia, 30 a metros mais acima.
E continuava mirando.
Vi mais tarde já em casa, que pela envergadura só poderia ser um Albatroz Viageiro, em extinção quase, a ser, estava demasiado a Norte do seu habitat natural.

Tinha mais de 3 metros de envergadura e bem que nos dava pela cintura.
Combinamos não assustar o bicho, nem sequer sermos bruscos nos movimentos, ele poderia estar cansado…mas porque não amarou ?
Forçou-nos a ficarmos no comando da embarcação para não ficar desgovernada, não podemos lançar o ferro.
Dos três, á vez, um ficaria no governo do bote, como companheiro tínhamos o nosso novo amigo.

Caçámos durante 6 horas em vários locais, sempre rumando a Sul.
Trocámos varias vezes a dupla na água, ele fitava-nos com aqueles lindos olhos, mas que lindos.
Viu-nos todo o tempo com um olhar de quem tenta perceber o que fazíamos.


O Caranks tinha 4 metros de comprimento, estavamos tão juntinhos, a sós claro que falávamos.

Era giro, quando tirávamos o peixe e o deitávamos na caixa olhava para a peça e quase que o percebiamos dizer……ahhh um Sargo…ahhh um Robalo !!

Este nosso amigo não se mexeu todo o tempo, somente nos sujou o cabo com alguma defecação ….lindo.


A ultima paragem na Baia da Amália foi marcante, começou a verificar-se alguma agitação no amigo.
Percebemos mais tarde ao sairmos dali, já em direcção de novo ao Porto da Barca rumo a Norte, o porquê.
Mal sentiu a direcção mudar, abriu as asa e partiu rumo a Sul rasando o mar a escassos cêntimetros.

Antigamente era considerada uma ave de mau agouro, a encarnação de marinheiros afogados.
Era, por isso, considerado azarento matar um albatroz. Tal superstição não os protegeu das perseguições, pois muitos os capturavam para aliviar a monotonia das refeições nas longas viagens marítimas.


A nós.... deu-nos uma ideia do que é ter dois mundos tão perto cada um com o seu espaço.

Amigo onde andas ?

Mago da Lua

4 comentários:

Anónimo disse...

Engraçado...não é fácil encontrar um Albatroz. A história desse "amigo" também a sei e reza um pouco diferente da tua: tornou-se ave de mau agoiro para marinheiros porque eles os matavam. O Albatroz é a Ave da Memória, do respeito pela Natureza, humana e de tudo quanto existe... Fica amaldiçoado todo o Homem que matar o Albatroz porque simbólicamente "esquece" quem é, de onde veio... e vaga no Mar das Brumas, onde nada distingue a não ser a névoa dos dias que passam...
Coleridge: The Rime of The Ancient Mariner, um dos poemas mais lindos sobre esse mito.
Olhar o mito cara...é encontrar-se consigo mesmo!
Muito curiosa a tua história, porque no mito original o Albatroz escolhe UM de TRÊS marinheiros para lhe passar esta mensagem. Qual de vocês foi escolhido? Qual de vocês mudou e não foi mais ao mar?

Mago da Lua disse...

wicka...eu não ía ao mar, eu vinha a terra.
Mas tenho estado cá muito mais tempo que o normal, de facto.
Volta sempre....branca.

Adoa Coelho disse...

Lindo! O que mais me impressiona é a capacidade de voo dessas aves. Fazem cada vôo mais louco!
Ah... como gostaria de não ter vertigens e experimentar umas coisas de voar!
Na realidade até prefiro assim! Sabes, é que os sonhos mais inalcansáveis são às vezes os que mais longe nos levam nos vôos imaginários e isso, meu amigo, não tem preço!!

Carpe diem!

Anónimo disse...

AUSÊNCIA
Num deserto sem água
Numa noite sem lua
Num país sem nome
Ou numa terra nua

Por maior que seja o desespero
Nenhuma ausência é mais funda do que a tua.

Sophia de Mello Breyner Andresen


Há sempre um tempo de partir
Outro de voltar
Um tempo estagnado
Enevnenado
Um tempo a sorrir
Tempo de chorar
No fim do Tempo...dormir...

 
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